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segunda-feira, 5 de outubro de 2015

BRASIL

Sem controle, alimentos circulam no país com agrotóxico irregular


É quase certo que a fruta, o legume e a verdura que chegam atualmente à sua mesa não tenham passado por nenhum controle rígido dos níveis de agrotóxicos.
Documentos obtidos pela Folha mostram que a fiscalização, quando é feita, atinge somente uma fração pequena dos produtos e reprova até um terço deles.
Por exemplo: análise por amostragem da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em alimentos típicos da cesta básica que circularam no Estado de São Paulo em 2014 mostrou que 31% tinham agrotóxicos proibidos ou em quantidade acima da permitida para os produtos.
O resultado dessa análise revela falhas na cadeia de controle da qualidade dos hortifrutigranjeiros produzidos e comercializados dentro do território nacional.
Um espelho desse quadro é a Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais), em São Paulo.
Por esse que é o maior armazém comercial da América Latina passam cerca de 30% de toda a produção nacional de alimentos atualmente.
Durante todo o ano passado, segundo informa documento do Ministério da Agricultura, só duas amostras de bananas foram coletadas ali para monitoramento.
"Não há controle, nunca vi nada. E trabalho aqui há 20 anos", afirma o feirante Cláudio de Jesus, 39, dono de uma banca de legumes na feira que funciona semanalmente dentro da Ceagesp, na zona oeste da capital paulista.
Esse depósito gigante distribui produtos para supermercados e feiras da capital, além de dezenas de cidades do interior e outros Estados.
"É lamentável essa falta de controle", afirma a dona de casa Adriana Lima, 29, que faz compras na Ceagesp há quatro anos.

SAÚDE

Potência na produção de alimentos, o Brasil é, por isso, um dos maiores consumidores de agrotóxicos do planeta. Entre as substâncias usadas no país estão algumas potencialmente cancerígenas, parte delas banidas da União Europeia e de países como China e Índia.
Os riscos à saúde vão de irritação na pele e nos olhos a dificuldades respiratórias, malformações congênitas, alterações no sistema hormonal e imunológico e câncer.
Para minimizar os efeitos, lavar bem os alimentos ajuda, mas não elimina todos os resquícios de agrotóxicos.
"É um risco inaceitável. Os gargalos não são acidentais, as autoridades fazem vista grossa", diz o defensor público Marcelo Novaes, que coletou todas essas informações oficiais para, inicialmente, estudar a situação em Santo André, na Grande São Paulo.
Suas conclusões serão apresentadas nesta semana.
A responsabilidade pelos agrotóxicos é de três órgãos federais: além da Anvisa e da Agricultura, o Ministério do Meio Ambiente também tem atribuição por sua área.
O trabalho de cada órgão, contudo, costuma dar em resultados contrastantes.
As 48 amostras analisadas pelo Ministério da Agricultura em São Paulo em 2014, por exemplo, incluindo as duas de bananas na Ceagesp, foram consideradas satisfatórias.
No mesmo período, a Anvisa detectou 31% de desconformidade nos produtos analisados em supermercados da capital e da Grande SP —muitos, provavelmente, haviam passado antes pela Ceagesp.
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QUEM FAZ O QUÊ

  • Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)
> É a responsável por analisar se a quantidade de agrotóxico presente no alimento é tóxico para o organismo humano
  • Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento)
> Responsável por fiscalizar estabelecimentos comerciais que produzem, importam ou exportam agrotóxicos
  • Ibama/MMA (Ministério do Meio Ambiente)
> A pasta deve garantir que os agrotóxicos usados na agricultura não estão destruindo o ambiente, como rios e matas nativas

DICAS
> Lavar os alimentos em abundância e retirar a casca
> Vinagre ou desinfetante específico para alimentos matam os micro-organismos
> A melhor saída é conhecer a procedência dos alimentos e, se possível, comprar produtos orgânicos
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OUTRO LADO

A responsabilidade pelo controle dos níveis de agrotóxico no país é federal, mas a atividade é compartilhada entre municípios e Estados.
Em ofício encaminhado à Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a Ceagesp reconhece que, desde 2009, não realiza monitoramento nos produtos que comercializa, uma média mensal de 283 mil toneladas.
Naquele ano, o órgão assinou convênio com o Ministério da Agricultura, que desde então passou a ser responsável pelo controle.
Antes das duas amostras de banana analisadas no ano passado, a última análise na Ceagesp havia sido feita em 2012, quando foram coletadas dez amostras de quatro culturas (batata, laranja, morango e pimentão).
Segundo o ministério, a prática foi alterada para "garantir maior rastreabilidade e abrangência", com o monitoramento sendo feito diretamente nos produtores ou no porto de Santos, antes de os alimentos serem exportados.
A Anvisa, que não publicou ainda relatórios sobre as análises feitas em 2013 e 2014, disse que fará a divulgação dos resultados até o fim do ano. Os números mais recentes disponibilizados pela agência são de 2012.
Ao justificar o tempo entre as coletas e a divulgação dos resultados, a Anvisa informa que, em alguns casos, o prazo da publicação de dados nos Estados Unidos, por exemplo, é ainda maior.
A agência afirma que está encerrando os processos de reavaliação de sete agrotóxicos, que começou em 2008, mas não estipula uma data para que isso ocorra. Outros produtos terão que ser analisados também, em decorrência de decisões judiciais.
Sobre a quantidade de amostras que analisa anualmente, a Anvisa afirma que a legislação "não especifica o quantitativo de amostras a serem monitoradas".
Ainda assim, a agência disse ter monitorado no ano passado os 25 principais alimentos de origem vegetal que compõem a dieta do brasileiro. Em 15 anos, ressalta, foram cerca de 30 mil amostras.
Sobre as diferenças de metodologia da Anvisa e do Ministério da Agricultura, cujos resultados muitas vezes são conflitantes, o órgão sanitário informa que são programas com "focos diferentes e complementares".
O trabalho da Anvisa colhe amostras nos locais onde a população geralmente adquire os alimentos.
Já o Ministério da Agricultura coleta amostras em propriedades rurais, estabelecimentos comerciais e centrais de abastecimento.



FONTE: Folha de São Paulo 

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