Ministro Gilmar Mendes diz que dinheiro do petrolão pode abastecer eleições em 2016
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo
Tribunal Federal (STF), disse nesta segunda-feira que as próximas
eleições municipais poderão ser abastecidas com recursos desviados da
Petrobras. Ele anunciou a criação de uma área de Inteligência no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cuja presidência assume em maio, para
que o país "não seja surpreendido" no pleito marcado para outubro.
"Essa é uma questão delicada sobre a qual vamos ter que discutir. Se de
fato houve apropriação de recursos ilícitos em montantes muito
significativos pode ser que esses recursos venham para as eleições na
forma de caixa 2 ou até na forma disfarçada de caixa 1. Vamos ter as
doações de pessoas físicas. Pode ser que esses recursos sejam dados a
essas pessoas para que façam a doação aos partidos políticos ou aos
candidatos. Tudo isso precisa ser olhado com muita cautela", alertou
Gilmar Mendes.
Em São Paulo, onde participou de um
evento na sede da Federação das Indústrias (Fiesp), o ministro alertou
"os escândalos todos que se acumulam, associados muitas vezes ao
financiamento eleitoral".
O ministro considera que será "um
desafio" coibir o caixa 2 nas próximas eleições e conclamou a sociedade.
"Temos uma eleição desafiadora. Pela primeira vez vamos ter uma eleição
sem doação de pessoa jurídica privada. Portanto, corremos o risco de
termos caixa 2, não cumprimento do que está na legislação e, para isso,
temos que contar com o auxílio da comunidade, dos vários setores, OAB,
Ministério Público, CNBB, para evitar que esses abusos desautorizem,
tornem um desvalor para o nosso sistema. Não podemos tornar essa eleição
agora um império do caixa 2, um mundo de faz de conta. Por isso temos
um grande desafio."
Ele criticou enfaticamente o veto às
empresas de fazerem repasses nas campanhas em 2016, pela primeira vez, o
processo eleitoral seguirá esse modelo. O ministro não citou nenhum
partido, mas apontou para o esquema de propinas na estatal petrolífera
desmontado pela Operação Lava Jato. "Uma questão fácil, típica até do
populismo constitucional, agora a gente vai resolver o problema. A causa
da corrupção está no financiamento privado. Logo, tudo o que ocorreu
aí, especialmente agora no Petrolão, está associado a esse fenômeno. O
próprio Supremo disse que o financiamento privado é inconstitucional,
então estamos absolvidos, até anistiados. Absolvidos, claro. Vamos
entrar numa nova fase. Façam o que quiserem, não tomem a gente como
bobos. Respeitem a inteligência alheia."
O ministro invocou seu próprio voto no
Supremo, ainda em 2015, contra a proibição imposta às pessoas jurídicas
de doarem aos políticos. Ele disse que, se "o partido do governo"
recebeu um terço dos desvios na Petrobras - estimados em 20 bilhões de
reais -, poderá financiar suas campanhas por longos anos. "Se ele (PT)
gastou na campanha presidencial (de 2014, quando Dilma Rousseff foi
reeleita) 360 milhões de reais, então tem dinheiro para campanhas aí até
2038, não é? Precisamos olhar isso com cuidado."
A estratégia para coibir o caixa 2,
segundo avaliação de Gilmar Mendes, passa pela mobilização da sociedade e
pela estruturação de uma área estratégica na Corte eleitoral. "Vamos
ter que criar um sistema de Inteligência, conversar com a Receita
Federal, conversar com o Tribunal de Contas da União, com o Banco
Central, com a Polícia Federal, para que estejamos devidamente
informados e não sejamos surpreendidos. Quando lidei com a prestação de
contas da presidente da República chamei para compor a equipe do
Tribunal (Superior Eleitoral) técnicos do TCU, do Banco Central, do
Conselho de Contabilidade. Precisamos renovar isso, mas de uma maneira
permanente. É preciso que olhemos isso de maneira ampla e tenhamos uma
estrutura permanente de cooperação para evitarmos surpresas."
Para Gilmar Mendes, "certamente haverá métodos, tentativas de burlar a legislação" nas eleições.
"Veja que, em grande parte dos
municípios, pequenos municípios, os vereadores, em princípio, não
poderão gastar mais que 8 mil reais. Essa foi a decisão do Congresso. É
uma quantia pequena. Talvez tenhamos uma campanha ecológica. Essas
pessoas farão campanha de bicicleta, não é? Porque não dá para comprar
muitos tanques de gasolina considerando esse limite. As campanhas para
prefeito não podem ultrapassar 100 mil reais. Ora, vamos ter que lidar
com isso e, de fato, informar a sociedade, divulgar quais são os limites
nos 5.800 municípios brasileiros e chamar a atenção. Não dispomos de
fiscais na Justiça eleitoral para dar atenção a todos esses municípios. A
própria sociedade terá que fiscalizar. A disputa municipal, às vezes, é
muito mais acirrada do que a disputa nacional. Então, é muito provável
que haja ânimo de violar a legislação, especialmente na ausência de uma
fiscalização mais visível."
Sobre os quatro pedidos de cassação de
mandato da presidente Dilma e do vice Michel Temer, sob crivo do
Tribunal Superior Eleitoral, o ministro disse que não acredita em
manobras protelatórias. "Agora que houve a citação vamos ter a
apresentação das provas, a oitiva de testemunhas. Não acredito que haja
manobras dilatórias. E, se houver, o Tribunal dispõe de mecanismo para
inibir. Quer dizer, eventualmente decidir ouvir uma testemunha em Marte,
ou coisas do tipo, são manobras que de vez em quando ocorrem, claro que
estou falando em sentido figurado, mas coisas desse tipo o juiz pode
indeferir, provas impossíveis ou coisas dessa índole. De modo que não
acredito que haja essa possibilidade, nem cogito que, de fato, a
assessoria jurídica da presidente e do vice vá se orientar nesse
sentido. Não nesse sentido, não me parece ser o padrão adequado.
Acredito que nesse período vamos ter essa decisão e é bom para o País.
Se for uma decisão de rejeição (dos pedidos de cassação) pacifica essa
temática. Se for uma decisão eventual de acolhimento também se resolve o
tema."
FONTE: Veja
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